segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Um homem, uma história, um programa

Por falar em putas.

Olho na janela e vejo elas indo e entrando toda hora no hotel... o ritmo é curioso para uma madrugada no meio de semana. Qual a diferença delas que estão ali em baixo ou daquela que acompanha um senhor grisalhos no auge dos seus 23 anos? De relance, penso que essas pelo menos escolhem saber exatamente o valor que estão lucrando utilizando seu corpo (que façam...livre arbítrio, lembra?).

Por outro lado, por que um homem escolhe estar com uma profissional ao invés de alguém que não está enxergando ele como uma carteira (pouco ou muito) recheada? Acredito que as respostas sejam mais simples nesse lado da moeda. O homem é simples, mulher é complicado. Faz parte do equilíbrio do universo que conhecemos.

Não existe motivo único. Único é o momento que levou ele a se entregar para uma desconhecida. É para fazer algo diferente que a patroa oferece em casa. É buscar algo que em casa não se tem (se a esposa é gorda, pega-se uma magra e vice-versa). É falar o que não poderia falar. É não falar e não discutir a relação no momento pós-relax. É satisfazer o ímpeto traidor sem buscar alguém que pode querer destruir com seu relacionamento atual (sim, é possível...já ouvi essa história). Eu poderia continuar essa lista eternamente... cada homem, cada história, um programa diferente.

Se pretendo me matar em pouco tempo....posso aproveitar para fazer as coisas que não faria se não estivesse no fim. O fim revela os desejos íntimos da pessoa. O meu está passando ente minhas coisas preferidas: cocaína, bebidas e sexo.

Tive uma vida sexual bem normal. Não era feio, mas não dava para dizer que eu era um galã de cinema. Ser loiro e ter olhos claros sempre me ajudaram... ainda mais quando ficava um pouco mais bronzeado na praia (pé na África, corzinha fácil). Também nunca tive reclamações sobre o meu... até um elogio que outro ele já recebeu. Sou um cara mediano. Podia não ser feio...mas sempre me achei quando era mais novo. Por isso investi em ser social, ter papo. As duas coisas juntas na faculdade fizeram com que eu me esbaldasse em romances durante a graduação (bons tempos!). Sempre fui curioso e mente aberta: uma, duas, três.... casa de swing, boites, prostíbulos de primeira a última categoria (dependia mais do orçamento do que da vontade). Meninas, mulheres, coroas.... uma noite ou companheiras de travesseiro. Posso dizer que tive uma vida apimentada. Só nunca consegui levar duas mulheres para cama simultaneamente (sem pagar, é claro!)

Desço um pouco do quarto e fico na esquina vendo o movimento.

Uma delas me chama a atenção. Cabelo ruivo, curto, combinando com uma pele branca, talvez pela natureza noturna de sua labuta. Seu vestido é vermelho, por isso me chama a atenção rapidamente. Em volta dela, as outras estão seminuas...de lingerie. Ela parece conservar um pouco de intimidade para o cliente pagante. Logicamente, não é uma garotinha: já aparenta ter vivido um pouco.... talvez seja o ritmo da carreira ou experiência de vida mesmo. Seus sapatos estão gastos e o vestido não tem aquela vivacidade de uma roupa que está na vitrine. Como dizem, é uma roupa de batalha.

Ela observa que estou olhando para ela. Ela sorri. Talvez por curiosidade de eu estar parado ali, ou por ser um provável cliente. A beleza de ser o cliente é que todos sorriem para você... até seus recursos acaberem. Penso: e por que não? Aceno para ela e subimos para meu quarto.

- Você tem nome?
- Depende. Que nome você gostaria que eu tivesse: alguma mulher em especial...
- Não... só foi um pergunta para quebrar o gelo.. como um "olá tudo bem" quando se quer aproximar-se de alguém
- Se você quer quebrar o gelo, meu nome é Alice
- Esse é seu nome real?
- Depende... você quer que seja? Agora eu sou sua, sou como você quiser.

Ela solta um botão de seus vestido.

- Me ajuda?

Vou para trás dela e sinto o perfume. Como está frio, o suor não apagou o aroma. Ele é simples, barato, mas tem um pouco de jasmin e laranja. Toque a fruta comum e da flor da nobreza. Certamente foi uma escolha para agradar a maioria dos gostos. Vou tirando botão a botão, desnudando suas costas... sinto os músculos e a respiração leve, experiente e nada ansiosa de quem não é uma menina do interior recém chegada na cidade par fazer dinheiro.

- Você tem quantos anos?
- Pouco para as histórias que tenho para contar, muito para entender que a vida não é um mar de rosas.
- Dificil ouvir tão belas palavras de uma...
- Puta? Você queria dizer... sou sim e reconheço. Não tenho problemas quanto a isso. Estudo, junto dinheiro... não quero para sempre tal rotina. É um meio para um fim.

Ela em encara com aqueles olhos verdes... me perco neles por um momento antes de continuar a prosa.

- Que interessante... eu sou professor..ou pelo menos era...não sei bem...passei por tanta coisa ultimamente.
- Você é você, ou pelo menos está você nesse momento... não se preocupe em te identificar... eu estou puta, não sou uma.

Neste momento o vestido cai, revelando uma lingerie de departamento... mas nem por isso deixa de valorar o corpo dela. Tem uma tatuagem divida ao meio pela calcinha... uma espécie de flor... acho que uma orquídea. Depois da fala anterior, pulei a parte de perguntar sobre a tattoo e voltei ao "papo cabeça"

- Então quem sou eu?
- Qual é o seu nome?
- [...]
- Esse é você...o resto é para o universo te rotular... esqueça o universo, nem que seja por agora, enquanto está comigo.

A confiança dela chega a ser confortante. Num momento pré suicídio, pode ser perigoso... pode me confundir... posso me apaixonar. Mas essa paixão não seria mais que uma fuga para a merda que quero fazer tempo após ela deixar o meu quarto. Provavelmente ela saberá do que vai ocorrer mais tarde... hotel pode ser barato, mas marcou a entrada dela e provavelmente será a última pessoa a me ver viva, isto é, posso complicar a vida dela. Devo falar com ela? Se eu falar e ela contar ao alguém? Aí saio daqui direto para uma casa de tratamento psiquiátrico... não é a melhor opção. 

Mas preciso falar com alguém... poderia ser com ela?

- E se eu não quiser ser mais eu? O que faço?
- Simples... mas nem tanto. Seja o que quiser, basta querer e ficar de peito aberto para a reação do universo.

Nossa, me senti um rato escondido num laboratório depois dessa.

- Ser mim mesmo não tem dado certo ultimamente... nada funciona, tudo que eu planejei foi pro saco.

Nesse momento ela se vira e bota a mão no meu rosto e sussurra ao meu ouvido. Palavras doces, escorrega a mão no meu... Quando uma mulher de acalenta, parece que o mundo fica mais quente... parece que o resto não importa. Está frio, mas ela encosta o seu corpo no meu enquanto busca aquecer-se. O calor humano deve ser a fonte mais incrível que se tem por essas bandas.

Ela tira aos poucos minha roupa...como se não tivesse pressa (apesar que tinha, pois tempo é dinheiro para ela). Seu perfume começa a invadir meus pensamentos e me lembro das paixões perdidas que deixei vida afora. Daquelas que amei sem ser amado, das que me amaram muito e eu nem fiz caso. Do amor correspondido que virou tédio, da paixão que apagou quando o tempo foi retirando seu valor extrínseco. Penso que o amor é algo que não deve ser discutido se existe, se é tangível ou não. O amor faz parte do caos que move o universo, é isso. Ser bom não significa que você encontrará sua cara metade. Nem se procura com afinco por ela, ou deixar de aproveitar os prazeres carnais, muito menos estar com pessoas divertidas enquanto se busca a alma gêmea. Se deparar com seu alfa é como ver dos meteoros colidindo: muitas coisas precisam acontecer para que tal momento fugaz ocorra... ou seja, é uma questão de sorte. Se você encontrou... agradeça e não a perca de vista... tal fenômeno se repetir é quase um milagre (não o católico, mas aquele que vai contra as probabilidades mundanas)

Eu tiro o pouco que falta da roupa dela... sem pressa também (não tenho muito mais para fazer depois que ela for embora, só terminar de vez toda essa novela). Ao abrir o sutiã, sempre passo trabalho com aquela presilha nas costas...as vezes acerto de primeira, as vezes só chamando um técnico de desarme de bombas da polícia. Ela dá um sorriso maroto e me deixa brincar por uns segundos com o aparato.. até retirar e lançá-lo ao chão. Muitas mulheres ficam mais lindas vestidas que nuas.... e esse não era o caso de Alice. O pagante tem um belo bônus nesse momento.

Ela me joga, de leve, na cama.... monta em cima de mim e deixa cair seus cabelos ruivos pelo meu corpo, subindo naturalmente até olhar nos meus olhos com um sorriso. Um segundo depois, vai a direita e busca novamente o meu ouvido para sussurrar. Suas palavras fazem me perder nos sentidos daquela noite fatídica, onde não pensei em quem sou como, como cheguei aqui e até que ponto eu poderia utilizar o futuro no meu vocabulário.

Não pensei em nada, somente em Alice... com quem tive o prazer de estar nessa noite. Ou pela menos nesses 60 minutos. O restante de Chronos, deus esse que ela dominava muito bem, falou de sua faculdade, de sua vida batalhada e de que como aquilo era só um borrão na sua história. Despediu-se de mim com um beijo e pedindo o primeiro cigarro da noite... já que fui seu primeiro cliente daquele turno.

E voltou para onde tinha surrupiado ela, por breves momentos.

Fico deitado na minha cama afundado naquele colchão ruim e heterogêneo. Balançado pela química do prazer realçado por mais uma carreira de pó, e o cigarro cinematográfico no final. Clichê se não fosse eu o ator... por que ninguém quer morrer imitando a arte como ela é.

O dia começa a raiar e a cidade volta a funcionar perfeitamente, sem mim... sem Alice. 







quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Erros e poucos acertos

O que será que acontece após o ato final? Saio do corpo e vejo a merda que fiz? Simplesmente acaba? Vou para uma terra de dor e expiações? Encontro aquelas virgens e rios de leite que prometem aos homens bomba? Ao estar próximo de meu próprio deadline, aperto Fast Forward nessa tape (sim, sou das antigas, caralho! É meu suicídio, eu dito as palavras que quero!) e vejo o prefácio da película da minha vida.

Nasci bem, meus pais não eram separados...e nunca foram.... estão juntos até hoje. Tirando alguns sustos no nascimento, como não nasci chorando (não pode ser macho, mas por estar afogado) parece que sou alguém frágil.... tenho uma mãe coruja morrendo de medo que qualquer coisa aconteça comigo.

Meus pais compram um imóvel financiado (nasci bem, mas não rico, nem perto disso) e se fodem com a tal da tabela SACRE e a hiperinflação. Trocamos um apê por um Fusca baleado.... e meu pai, o arrimo da família, foi morar na casa dos fundos da sua mãe com a sua esposa e filho recém nascido. Primeira derrota financeira da família..primeira de muitas.

Ambos são servidores públicos...cada um vez mais fodido e mal pago pelo governo oportunista da década de 80. Abertura democrática  roubo escancarado. Acho que uma das coisas que perdemos pós Ditadura é que os líderes roubavam menos e com menor ousadia. Por causa do caos financeiro da família, fui privado de muita coisa na minha vida. Podia não ter os mimos que uma criança de classe média sonha, mas nunca me faltou comida, carinho, educação e ensino de qualidade. Eu podia não ter o melhor brinquedo, mas estudava numa excelente escola.

Meus pais não eram muito instruídos. Nenhum deles fez faculdade. Mas sempre me incentivaram a ler, apreciar, conhecer. Dizem que toda a criança é uma esponja quando está pelos 5 a 8 anos de idade... eu acho que esse etapa nunca deixou de terminar para mim.... sempre amei aprender. Logo fui me destacando no ambiente escolar como um menino acima da média... parece que o "investimento" em escola boas tinha dado certo (e é um milagre, pois muitos desdenham e não aproveitam nada do que muitos pais se matam para pagar). Cresci como um menino acima da média.

Como era de se esperar, a comunidade sempre me superestimou. "Esse guri vai longe", "Você precisa se dedicar mais sempre, você tem um grande futuro pela frente", "Você é muito esperto, vai ter tudo que quiser" entre outras pérolas que uma pessoa privilegiada cresce ouvindo. Meu QI beira os 200 (o que isso quer dizer? Que estou entre os 1% mais inteligentes da humanidade  assumindo que a distribuição de QI na população seja normal...que quer dizer... deixa para lá, pesquisa no Google, pô!)

Agora me encontro com trinta anos. Longe? Fui... até Brasília para protestar contra um sistema ineficiente. Dedicação? Fiz até o Doutorado, isto é, 25 anos de instituição escolar, sem contar os intervalos (que podem perceber que foram poucos). Esperto? Nem tanto.... O que eu tenho? Nada. Moro num colchão na casa dos meus pais, tenho uma bicicleta e até um segurança de supermercado é melhor sucedido que eu. Tenho futuro? Cheiro mais uma carreira e dou um gole no meu vinho... percebo que não. O futuro é algo que não tem o prazo muito longo para mim... nem horas, no máximo minutos.

Que mundo é esse que nós vivemos? Vejo todas as pessoas andando de carro por aí como se fossem bem sucedidas...ganhassem rios de dinheiro. Via meus alunos chegando de auto para ter aula trabalhando como estagiários (e eu, o professor bacaca, na parada de ônibus). Vejo um garoto aqui da minha rua que nem tem profissão e está todo o dia dando "banda" com seu "possante". Como eles conseguem? Que mundo é esse que não premia aquele que tem o trabalho mais complexo? Como um político ou um advogado pode ganhar rios de dinheiro sendo somente representantes do povo ou operadores da lei de um povo ignorante que não sabe nem escrever seu nome corretamente (e diz "escrever direito")? Eu fiz um dos cursos mais difíceis de uma universidade, onde somente uma entre dez pessoa que entra acaba saindo com o diploma.... e ganho menos que um estagiário de administração que fica servindo café a um diretor de multinacional?

Chegou a um momento da vida que me rebelei pela escolha profissional que fiz. Em nenhum momento disse que sou ruim no que faço... bem pelo contrário... conheço poucas pessoas que fazem tão bem o que faço como eu... nunca me faltou emprego na área, e nunca fui demitido de lugar algum. Sempre que entro numa seleção de emprego... eu sou escolhido (a não ser que eu não queira). Sou muito bom no que faço... um dos melhores. Mas do que adianta ser um talento se não se tem o reconhecimento por ser tal? Que sociedade é essa que remunera o idiota e o gênio na mesma proporção? Socialismo? Não...pq numa comunidade igualitária se ganha a mesma coisa, mas o reconhecimento vem de outras formas. Ganho pouco e ainda sou tratado como um mero.... um mero merda que está a mercê da instituição e das pessoas que contratam os serviços dela. Ética profissional? Pega essa papel e joga na privada....

Saí do rumo e fui buscar um novo caminho. Como estava desesperado e buscando uma mudança brusca de situação vida... conheci o melhor e o pior do mundo que nos cerca. Nesse mundo, existe um monte de pessoas querendo fuder a primeira pessoa que acredita na sua palavra. Fui a fundo em todas as maracutaias de enriquecimento rápido que existem. Pensei: sou inteligente e capaz...se alguém enriqueceu fazendo isso, eu posso também. Me dedicava e enchia o saco de todos a minha volta falando que o que eu estava fazendo  era o negócio do século (sempre fui bom vendedor, sei passar o recado e vender o peixe como poucos).

Cada empresa que passei ganhou o seu para sobreviver....e me deixou ferido no meio do caminho. Foi perdendo a confiança dos meus próximos (ah, lá vem ele de novo...) e a desaprovação da minha família. Parece que eu era o cara que tinha uma habilidade de escolher errado, de ser o pato de um negócio da china.

Essa habilidade de escolher errado é o motivo de eu estar aqui, com esses pensamentos. É como se eu tivesse uma pré disposição a escolher sempre o que é pior para mim, pensando ou não na decisão. As vezes  sinto vontade de viver como o coringa aconselha o duas caras: deixe o caos agir e decidir.

Até a escola não precisei decidir nada....tudo era fácil.... era só estudar e me preparar para os exames de admissão na faculdade federal. Passei com folga para o meu curso, ser o que sou era natural para mim. Achei que a vida era fácil.... era só continuar que "as portas abririam para mim". Parece que não... elas até abrem...mas sempre te cobram um preço.

Minhas escolhas ruins começaram no exército....escolhi sair depois de me graduar oficial. Escolhi ficar na universidade e me aperfeiçoar. Escolha errada? Até que não...só foi um caminho sem dinheiro por muitos anos. Sem dinheiro, com crédito e com compulsão por gastar... me afundei bastante durante a graduação.

Saí de lá decidido a juntar dinheiro e planejar minha independência financeira (coisas eu li durante a fase de mudar de vida). Parece que cada emprego que pegava eu só gastava mais....fazia uma ginástica tremenda para trabalhar muito e gastava bastante para isso. O lucro era sempre pequeno e não sanava minhas dívidas.

Decidi apostar tudo no mestrado...para seguir carreira acadêmica. Tudo mesmo! Como não tinha tempo para montar o projeto, me demiti dos lugares que trabalhava e me afundei na tentativa....que deu errado. Dei  para trás no meio da seleção por que estava apaixonado por alguém..e esse alguém disse que não daria certo se eu seguisse no mestrado. Engraçado...não fiz o mestrado, nem fiquei com a puta. 

(segue mais no próximo post)

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Prólogo: hotel california

E agora?

Começo a observar as paredes do hotel. Acredito que quando mencionei a classificação do cubículo que estou enclausurado você dever ter pensado em um hotel de luxo ou num porcaria de sexta categoria. É feio, paredes manchadas... ouço a sirene e duas putas discutindo no térreo. Todo o barulho nesse inferno próximo da rodoviária só acelera o desejo... de acabar com tudo isso.

Puxo uma coca-cola quente do frigobar e acendo um cigarro. O que um suicida deve fazer ao praticar o ato que irá defini-lo? Pois todo mundo sabe (mais ninguém diz) que ele pode ter sido tudo: professor, advogado, médico, vagabundo, traficante, político....mas se ele acabar com sua vida, será lembrado como aquele que se matou, e esse era seu principal legado a humanidade.

Vamos ao check list do material disponível:

Notebook: Difícil, nem choque eu consigo levar dele
Cabos e fios do note: são atrativos... mas será que aguentarão meus três dígitos de peso? Se for para fazer, tem que se ter certeza: a última coisas que quero é um hematoma no pescoço e ir para tratamento psiquiátrico.
Roupas: confortáveis demais para uma forca.
Celular: para quê eu tenho essa merda? Se alguém me ligasse, provavelmente não estaria aqui
Kit barba/banho: Intoxicação? Não... doloroso e de fácil recuperação. Vou acabar tendo uma lavagem estomacal no PS. Bons tempos aquele que se tinha um fio descartável para a navalha... bons tempos!

Droga... nada funciona. Sou um merda, nem me matar consigo!

Acho que vou ter que sair, dar uma volta. Quem sabe nessa caminhada eu penso....penso... no quê? Não posso vacilar, não posso dar o passo atrás, o suicídio é o fim da treva, é a redenção daquele que não aguenta mais o fardo carregado. Fraco, talvez..... cansado, quase sempre.

Antes de sair pela porta, olho para a janela. Pular dela resolveria? Meus problemas não, claro....mas poderia fim a todo o sofrimento. Estou no quarto andar, maldito prédio velho! No quarto andar parece alto, mas não o bastante para ter certeza que abracarei o solo e tudo acabará. Se fosse no décimo, tudo bem... mas quarto é pouco. Ainda mais, quero uma saída discreta de cena... sou professor, palestrante, muitas pessoas espelham-se em mim. Não quero acabar com o sonho deles também.

Ao descer as escadas, passando pelos "casais" arranjados na esquina ao lado do hotel, penso que podem existir coisas piores que a morte. Quanto vale uma vida sem sentido? Para mim, nada. Se não há caminho para trilhar..para quê andar?

O problema é que, seguindo tal lógica, teríamos suicídio em massa.... a busca pelo sentido da existência só existe e é percebida no momento que o humano adquire certa neuralidade (Penso, logo existo? Certamente...mas pensar é difícil e dói para a maioria dos mortais), já que muitos indivíduos nascem, vivem, procriam, envelhecem e morrem sem um relampejo de existência Nietzchiana.

Não sei se onde tiram que a humanidade evoluiu. Nós somos quase sete bilhões de seres carnais. Enquanto alguns alcançam o espaço e desenvolvem/fazem coisas incríveis, 99% dos outros vive para assistir. Assiste os filhos virarem grandes seres, assistem reality shows, séries, novelas, filmes... vivem a vida dos outros, seja ela de verdade ou de mentira. A massa é passiva ao seu próprio microuniverso. E ainda vêem com a desculpa que é para "passar o tempo" (rá, ele é limitado!! E vc vai desperdiçar ele?) ou "é para relaxar" (volto a frase sobre que pensar dói...sem mais, meritíssimo!!)

Mesmo assim, há coisas piores que uma vida sem sentido. Uma vida vivida por outros, como as mães que fazem das filhas o que elas gostariam que fizessem, pais que passam a "herança profissional" para os filhos sem saber se é isso que eles querem. Descendo mais ao inferno na terra, ter que viver para o dinheiro e ser escravo dele (nessa altura corretores, muitos advogados e prostitutas acabam revelando mais aspectos comuns que as primeiras categorias gostariam de se assemelhar). Há muitas maneira de morrer, e manter seu coração batendo no peito.

Por que então se despedir da terra? Uma razão simples. Não sou mais como os outros, não posso só assistir, não posso ser passivo, não consigo viver sem sentido.

Me lembro do clipe da música do Eagles no momento.


Hotel California

On a dark desert highway, cool wind in my hair
Warm smell of colitas, rising up through the air
Up ahead in the distance, 
I saw a shimmering light
My head grew heavy and my sight grew dim

I had to stop for the night
There she stood in the doorway
I heard the mission bell
And I was thinking to myself

This could be 
Heaven or this could be Hell
Then she lit up a candle and she showed me the way
There were voices down the corridor

I thought
I heard them say
Welcome to the Hotel California
Such a lovely place
Such a lovely place
Such a lovely face
Plenty of room at the Hotel California
Any time of year
Any time of year

You can find it here
Her mind is Tiffany-twisted, she got the Mercedes-Benz
She got a lot of pretty, pretty boys, that she calls friends
How they dance in the courtyard, sweet summer sweat

Some dance to remember, some dance to forget
So I called up the Captain
Please bring me my wine
He said: "we haven't had that spirit here since nineteen sixty-nine"
And still those voices are calling from far away
Wake you up in the middle of the night

Just to hear them say
Welcome to the Hotel California
Such a lovely place
Such a lovely place
Such a lovely face
We're livin' it up at the Hotel California
What a nice surprise
What a nice surprise

Bring your alibis
Mirrors on the ceiling
The pink champagne on ice
And she said: "we are all just prisoners here, of our own device"
And in the master's chambers
They gathered for the feast
The stab it with their steely knives
But they just can't kill the beast

Last thing I remember, 
I wasRunning for the door
I had to find the passage back
To the place I was before

"Relax", said the night man
We are programmed to receive
You can check out any time you like
But you can never leave

Nesse caso, o capitão está conformado com a prisão. É o sentimento humano de opressão e submissão... não se pode voar, mas garanto abrigo e alimento em troca de sua liberdade. A minha pergunta é: será que, se o narrador da aventura tivesse conformado com a prisão e tomado seu dose preferida ouvindo as histórias de um Capitão perdido no espaço-tempo.... não teria sido melhor? Para mim, matar a besta é sair da zona de conforto e deixar de ser passivo...de pensar....de questionar..de sempre buscar mais. Quando Cypher (Matrix, 1999) diz que prefere a ilusão à liberdade....está totalmente errado?

A ignorância é uma benção, diz ele ao degustar um filé que não existe, num restaurante que não existe. O problema é que quando se mata a besta, não há como voltar para o hotel e estender sua estadia por lá.

Deixo a filosofia de lado e começo a pensar no plano. Será que consigo comprar uma arma a essa altura do campeonato? Seria uma morte espalhafatosa, artística de certa maneira... mas ao mesmo tempo reclusa e privada. Bom, é uma opção viável. Um tiro.

Eu podeira comprar toda a bebida que meu cartão de crédito (já estourado para a próxima fatura) pode arcar. Beber todas, dentro da Hidro, até dormir. Não sei....morrer bêbado parece ser um final alinhado com um ex-pensador, historiador...alguém que gosta de escrever e pesquisar. Quantos intelectuais (me faltou a palavra antes) morreu de pileque? Muito, certamente. O problema é que morrer de ingestão de álcool é difícil...e afogado nem pensar, dizem que afogamento e congelamento são as piores. Hipóteses descartadas.

Mas ainda fiquei matutando sobre a Hidro....é chique, por pior que seja aquela tina...manchada com sabe-deus-o-quê dos transeuntes e das putas que utilizam o Hotel como "escritório". Cortar os pulsos? É um boa opção...nem deve doer tanto. Tem algumas dicas que peguei na internet que aceleram o processo. Que coisa! Até isso se encontra no oráculo moderno (google).

Antes de entrar no super, acendo mais um cigarro para pensar.

No meio dele, fito um moleque na esquina oposta, sob uma sombra. Será que é um traficantezinho? Pode ser.... dizem que ali é ponto. Eu poderia morrer de overdose, viajando até Marte com heroína ou acelerando meu coração até explodir com o cocaína. Seria bom para mim que vou, mas vergonhoso para a minha família que irá me encontrar. Não posso me livrar dos "bagulhos" depois que usar ou sobrar, certo?

No fim, não decido nada no momento. Não me falta coragem para ir até o fim, mas quero que seja do jeito certo...afinal, sou eu o principal beneficiário do plano. Entro no super, pego um bom vinho, encaro o garoto e pego um pouco de pó e retorno ao meu quarto, para pensar. Após algumas carreiras e duas taças de vinho, vou começar a planejar com mais seriedade.